Opinião - Professor Carlos Bizzocchi

Olavo de Carvalho, influenciador do presidente eleito Jair Bolsonaro, em entrevista à Folha de S.Paulo na última segunda-feira (26), recriminou a educação sexual nas escolas. Declarações no mínimo polêmicas e que merecem atenção especial, já que ele foi responsável pela indicação de ao menos três novos ministros.
Infelizmente, a discussão em torno do assunto em texto postado por mim no Facebook escancarou a realidade: vivemos ainda em clima de campanha, com o culto a fantasmas e fatos que não ajudam em nada a discussão de temas tão caros ao país. O fato é o seguinte (para quem ainda não entendeu): Jair Bolsonaro será o presidente do Brasil a partir de 2019! Ele fará um governo de acordo com o modo dele de ver o mundo, e alguns que estão a seu lado (como é o caso de Olavo Carvalho) darão pitacos que serão aceitos parcial ou integralmente.
O jogo democrático (é preciso entender isso!) a ser praticado por aqueles que veem o mundo de maneira diferente da dele é arregaçar as mangas e não permitir que assuntos prioritários se radicalizem e prejudiquem o país. Socialistas terão de esperar para ver sua ideologia reinar sobre este solo, mas terão de se mobilizar para que radicais conservadores e da direita nefasta não oprimam liberdades nem façam o país recuar no tempo. Num governo que será conservador e economicamente liberal, quais as flexibilidades que se devem buscar para que ele não tenda ao exagero e amplie as exclusões?
A educação é um tema prioritário. Não é a educação sexual que está errada, é a educação em si. Pedir o fim da educação sexual porque ela não ensina, é pensar que português, matemática e ciências também devem ser abolidos, pois nossos jovens chegam ao fim do ensino médio sem saber escrever, interpretar textos, fazer contas ou diferenciar uma pesquisa científica de uma opinião de blogueiro. É nisso que precisamos concentrar nossas forças e canalizar nossas opiniões.
Se houve ou não o kit gay, se Dilma gostou ou não... é coisa que está lá atrás. E a educação precisa olhar para frente! A criança brasileira precisa receber um ensino de qualidade que a capacite a enfrentar a realidade dos próximos anos – nós educamos para o futuro; a ser crítico a uma sociedade que se afoga no consumismo e que destrói o planeta para produzir os bens que consome; que precisa fazer as leituras necessárias de mundo e da tecnologia; que precisa aprimorar os relacionamentos para que a humanidade seja mais fraterna e cooperativa. E isso também é papel da escola.
Aqueles que defendem a família como único condutor da educação devem sair de sua caixa de raciocínio “classe média alta” e se lembrar que vivemos num país com metade da população abaixo da linha de pobreza, que não tem/teve acesso a informações nem tempo para se dedicar aos filhos para educá-los. Devem se lembrar que a estrutura familiar que vigora nas camadas menos favorecidas é totalmente disforme e caótica e que a escola cumpre o papel desta complementariedade. Sem a escola eles ficarão sem rumo, sem direção. Ir a escola apenas para adquirir conhecimentos é alienar as gerações futuras.
O professor deve, sim, ser o responsável por acolher este desamparo cultural e cognitivo e precisa estar preparado o bastante para tratar de assuntos que conduzam o aluno a uma formação integral, ética, crítica, conteudista, antenada com o contexto socioeconômico-cultural que vivemos. Exigir isso de todos os pais é ignorar a exclusão cultural a que eles foram submetidos nas décadas anteriores. Voltando ao ponto inicial, só para complementar o raciocínio sobre os professores, se hoje eles são ruins, vamos extinguir a função? Ou aprimorá-los?
A Educação nacional precisa de discussões mais nobres. É preciso lembrar que a campanha eleitoral já acabou; livrar-se dos preconceitos e ideias engessadas e das frases prontas; elevar-se acima da necessidade de fazer prevalecer sua opinião sobre a dos outros.
O governo é de Jair Bolsonaro, precisamos exercer (bolsonaristas e oposicionistas) o papel de cidadãos e, por meio da pressão da opinião pública sobre o Executivo e sobre os legisladores, mediar as discussões para elas não pendam para o exagero. Mais que isso não vai acontecer e as energias serão gastas inutilmente e de forma pouco inteligente.
Pela educação ampla, de qualidade e equilibrada que não exclua disciplinas e áreas que podem contribuir para jovens conscientes e críticos, donos de seus próprios caminhos e construtores autônomos de suas próprias opiniões.

Comentários

  1. Pesquisando sobre o assunto, encontramos uma pesquisa cuja maioria dos brasileiros se mostram a favor da discussão promovida pelos professores sobre educação sexual, no entanto, vemos o quão polêmico é esse assunto!
    Lembro que na minha época de ensino fundamental II abordavamos o tema de forma "mascarada", fazendo trabalhos e apresentações sobre doenças sexualmente transmissíveis. Já no ensino médio, discutíamos sobre o assunto (não com frequência) questões como prevenções contra gravidez e doenças.
    O fato é, a forma com que é aplicado, desenvolvido esse tema com nossas crianças e jovens. Temos um grande problema aí: precisamos formar cidadãos, críticos, e tratar sobre a realidade do país. No entanto, temos a família por trás dele, que apresenta seus valores e crenças. Então o que fazer?
    Acho muito importante tratar sobre o assunto, ainda mais nos dias de hoje, onde tudo é muito fácil, a sexualidade é mais aflorada ... Porém, acho importante a forma e principalmente conteúdo que se apresenta e para isso, os educadores precisam estar preparados e capacitados para isso. Então, mais uma vez, caímos na questão da formação dos professores!
    Não que a educação sexual não seja importante. Muito pelo contrário! É um problema sociocultural que vivenciamos no Brasil. No entanto, vejo um número tão grande de educadores que precisariam de formação (e um pouquinho de consciência também) para "conteúdos tradicionais", será que esses estão aptos a trabalhar um tema tão importante que fará diferença na vida desses jovens?
    De acordo com o procurador regional da República no Distrito Federal Guilherme Schelb ele afirma que quando se trata de questões de sexualidade, a escola e os professores podem cooperar com a família. Antes de abordar temas da sexualidade, muitos até impróprios para certas faixas etárias como bissexualidade, masturbação, coito anal, prostituição, sexo grupal, etc., a escola deve apresentar às famílias dos alunos menores o conteúdo e material pedagógico que pretende apresentar e abordar com crianças ou adolescentes, para que a família previamente autorize ou não”, afirma.
    Como citei acima, acho mesmo de suma importância tratar sobre a orientação sexual, porém, acredito que é preciso ter cuidado para não enfatizar a opinião individual do professor de forma que reprima a opinião adversa do aluno. Precisamos acima de tudo, desde pequenos, ensinar o respeito! Respeito mútuo! Independente da crença, valores, devemos respeitar o indivíduo em qualquer forma! E quanto a opinião do senhor procurador, discordo em pedir permissão a família. Se aquele professor estiver apto e preparado para trabalhar sobre o tema, não precisa pedir permissão, uma vez que é direito de todos receber esse tipo de conhecimento e instruções.
    Como educadora, penso que não deveria abolir orientação sexual no ensino. Mas acredito que é preciso ter cuidados na forma em que é apresentado e que todos deveríamos passar por um processo de formação.

    Camila Soares Delvechio

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  2. Acredito que agora só nos resta esperar e ajudar, dentro do nosso alcance, dentro ou fora da sala de aula, o governo do nosso novo presidente, sendo ele a sua opção ou não, se ele afundar esse barco continental, nós afundaremos juntos.
    A respeito da educação sexual dentro da escola, eu fico muito em cima do muro, acredito que deva ser passado SIM nas escolas, porém não dá forma que é feita, deveria ser trabalhada com duas matérias:
    -A parte biológica, demonstrando a diferença entre macho e fêmea, sem destinação de gênero, sem preconceitos, a "pura" biologia, ensinando órgãos reprodutores, origem de gametas (pois acredito que aprofundando e usando termos mais técnicos auxiliam as crianças a entender a seriedade do assunto), prevenção de doenças, uma iniciação em parte hormonal e etc.
    - A parte psicológica, que ensina a tratar pessoas como pessoas, que acredito que seria a matéria de sociologia, abordando a homossexualidade, destinações raciais, ensinar o aluno a respeitar os humanos em geral, se vc ensinar um aluno a respeitar todos vc não precisaria explicar a diferença de um para o outro, ele iria respeitar do mesmo jeito.

    Eu sou contra o tal kit gay, sendo ele aplicado ou não nas escolas. Mesmo sendo um material bom, acredito que a didática não é boa, em relação com esse assunto deveria ser mais aprofundado e não superficial baseado apenas em um "manualzinho".

    Em contra partida também tenho medo da didática proposta pelo futuro governo, pelo mesmo motivo, não podemos tratar esse assunto de forma banal, superficial. Mas acredito que na nossa situação atual temos preocupações maiores como a reforma da previdência, então, como disse no começo do texto, querendo ou não temos que auxiliar o nosso novo presidente nessa nova jornada brasileira.
    Fernando Simioni

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